sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Uma Cápsula para Acordar - Parte Final

OK, esta é definitivamente a última parte. Não sou um bom escritor, portanto podem desabafar a vontade nos comentários. Para acessar o capítulo anterior, clique aqui.



  Mac-22 apertou a tecla que encerrava a comunicação com o terminal. Fim do expediente. Olhou mais uma vez para a cadeira vazia de Jo-33 e suspirou. A garota deveria estar em maus lençóis. Estava sumida desde a quinta-feira (e já era terça!), sem responder mensagens e T-SMS. Primeiramente, ele achou que ela estava doente - afinal ela não parecia bem no dia anterior ao sumiço. Mas agora achava que era algo mais sério e estava disposto a descobrir o que era.

  Havia conseguido o endereço dela com o supervisor do setor, que estava realmente irritado com o acúmulo de trabalho na mesa da menina sem satisfação. Tomou um transporte direto pra casa de Jo-33 e pelo trajeto projetado pelo seu smartphone, iria levar duas horas para chegar lá. Até lá, Jo-33 tinha que ficar bem. Mac-22 recostou-se no banco do transporte e adormeceu.

  Jo-33 estava deitada em um beliche localizado em um lugar muito apertado. Olhou em volta: uma cabine de passageiro toda metálica. Pelo balançar, deveria ser de navio ou trem. A cabine estava na penumbra. Havia um armário pequeno, uma mesinha vazia e um espelho. Jo-33 estava vestindo roupas da Guarda Aerospacial Russa, que ela tinha visto uma vez nas férias. A cabine balançou e ela teve uma visão rápida do mar. Era uma cabine de navio.

Jo-33 escorregou pra fora do beliche. A cama logo abaixo estava desarrumada. Ouviu um barulho e percebeu que ao lado do armário tinha uma porta. Havia luz vindo por debaixo dela e um barulho lá dentro confirmou que havia alguem lá dentro. "O banheiro da cabine, só pode.", pensou Jo-33.

  - Querida, é você? - disse uma voz masculina em alto e bom russo.
  - Sim, sou eu - disse Jo-33, estranhando o fato de poder conversar em russo!
  - Estou terminando aqui. Não é bom você entrar, está uma sujeira dos diabos! - e o homem riu desesperadamente.

  Jo-33 se dirigiu para a saída da cabine e... espere! Cadê a porta da cabine?

  Nessa hora a porta do banheiro se escancarou de vez, fazendo um enorme barulho. O homeme parecia ter uns noventa anos, carcomido, enrugado e curvado. Não tinha o olho direito, apenas um grande buraco escuro e vermelho, o sangue pingando ainda fresco na roupa. Vestia o mesmo uniforme que Jo-33, mas com a diferença de que estava encharcada de sangue. Seria sangue dele? O velho começou a sair da cabine lentamente. Seus passos chapinharam no sangue e assim que Jo-33 baixou os olhos, um braço vindo de dentro do banheiro tombou sobre a poça.

  O velho gargalhou. Seus dentes eram apodrecidos e estavam sujos de sangue.

  - Esse deu trabalho. Precisei usar um martelo para abrir a cabeça dele e devorar o cérebro. - disse o homem rindo. - mas os olhos tinham um gosto amargo. Por isso comi o meu mesmo.

  Jo-33 tentou gritar, mas o som da sua voz não saía. Imediatamente correu para onde deveria estar a porta, mas seu corpo ragiu muito lentamente. Ela escorregou e caiu. Quando bateu a cabeça no assoalho plastificado, veio a revelação: ainda estava sonhando!

  - Droga, eu preciso acordar!

  Então rapidamente se levantou e lá estava ela - a porta da cabine! Antes que o velho chegasse até ela, Jo-33 abriu a porta com força e saiu da cabine. Dançou no ar e despencou diretamente na água gelada do mar. A roupa grossa molhada impediu os movimentos iniciais e ela começou a afundar. Então de repente ela se lembrou "É um sonho! O achbuld está me fazendo sonhar!". Fechou os olhos e esperou alguns segundos.

  Quando abriu, estava emergindo de uma piscina de água fresca em plena manhã de primavera. Olhou ao redor: estava de biquini em um holoclube grã fino. Um belo jardim florido cercava a piscina e ao lado uma mesa com café, sucos e outras guloseimas. Em um holoclube tudo isso era falso, mas as pessoas pagavam para ter os privilégios de frequentar lugares que não existiam mais, como o Himalaia e o Grand Canyon. As vezes, eles se relembravam de como era gostoso ter um final de semana em família ou como era bom caminhar ao ar livre e ouvir o canto dos pássaros. E por isso criavam simulações como essas que Jo-33 estava imersa.

  Mac-22 despertou com o balanço do transporte que parava um um ponto antes do qual ele precisava descer. Esfregou os olhos e o estômago roncando terminou o seu despertar. Levantou-se e preparou-se para descer no ponto seguinte. Enviou uma mensagem para Jo-33 avisando que estava chegando.

  Jo-33 saiu da piscina. Podia ouvir os cantos dos pássaros de fundo. Caminhou até a mesa e viu que depois da cerca viva havia um vestiário. Foi até lá e abriu a porta. Estava tudo escuro. Jo-33 tateou em busca do interruptor e ao acender, teve uma sensação estranha: já tinha visto aquele cenário. Ela estava no corredor do primeiro sonho, o hospício. No entanto, as celas estavam todas abertas.

  Enquanto caminhava, percebeu que estava nua. O corpo sentia o frio do azulejo das paredes e os pés pisavam no lodo escorregadio do chão. Cada uma das celas exalava um cheiro de podridão e morte. Gritos vinham de outros lugares, provavelmente os andares superiores ou inferiores. Nesse momento, um homem vestindo trapos do que um dia foi uma camisa de força, aparece no fim do corredor. Ele portava uma faca e pelos respingos de sangue, havia sido recentemente usada.

  Só então se deu conta que estava sonhando de novo. Estava ficando desesperada. O malucom começou a lamber o sangue da faca. Lembrou-se que em suas pesquisas, mencionavam que ninguem morria em um sonho: o cérebro não conseguia processar essa informação de não-existência, o que levava a pessoa ao despertar. O maluco começou a caminha rdevagar, os olhos fixos nela. Jo-33 então pensou que se provocasse uma morte, talvez pudesse despertar desse sonho ruim.

  Ela viu uma janela ao longe. O louco começou a correr até ela desenfreadamente, mas Jo-33 já estava correndo para janela - e ela era mais rápida. O chão frio fazia os pés da garota doerem. Uma mulher descabelada saiu de uma das celas do corredor, gritando. Jo-33 desviou dela e alcançou a janela. O louco parou para esfaquear a descabelada, o que deu a Jo-33 a oportunidade de subir na janela. Olhando para o chão de cimento dez andares abaixo, Jo-33 pulou.

  Mac-22 chegou ao apartamento de Jo-33. O porteiro eletrônico confirmou que a moça não saira de casa todos estes dias. Mac-22 ficou preocupado e pediu solicitação para entrar. O porteiro afirmou que não havia autorização prévia para entrar e que ele precisava solicitar a moradora. Mac-22 ficou esperando. Depois de um tempo, o porteiro eletrônico afirmou que a moradora não respondia às requisições, embora o sensor de presença revelasse que ela ainda estava no apartamento.

  O rapaz lembrou-se de que Jo-33 havia registrado uma permissão especial de acesso para emergências, mas o número estava lá no escritório. Ele ligou para lá na esperança de que o pessoal do turno da noite pudessem atendê-lo. Demoraram, mas atenderam. Depois de muita conversa com o escritório e verificações com o porteiro eletrônico, Mac-22 obteve permissão de entrar no apartamento.

  Mac-22 encontrou a casa em ordem, porém suja da poeira desses dias todos. Jo-33 ainda estava deitada na sua cama de lençóis limpos, ao lado de algumas seringas vazias. Ela tinha um rosto agonizante, de dor. Ele chamou a emergência pelo canal restrito e tentou reanimá-la, em vão. Jo-33 tinha cruzado a linha do simples cochilar para o sono eterno, uma linha que ela jamais cruzaria de volta. Tudo o que ela precisava - e não ia ter - era uma cápsula para acordar.

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