sábado, 9 de fevereiro de 2019

Aquaman: Banho na concorrência ou balde de água fria?


  
É um pouco difícil definir o filme Aquaman, estrelado por Jason Momoa e dirigido por James Wan, em cartaz desde dezembro de 2018. 
  Digo isso por que me trazem vários elementos que me são desconfortáveis, insuficientes para tornar o filme tão lucrativo quanto ele vem se tornando - 1 bilhão de faturamento e ainda contando. Mas o que torna este filme um "peixe fora d'água" em relação aos demais que a DC tentou emplacar no cinema sem muito sucesso? 
  Ou será que ele é só mais um banho de água fria nas altas expectativas?


  Não é fácil apontar e julgar. Aquaman, foi o modo da DC de dizer "não queremos mais um universo cinematográfico compartilhado" - ele ainda tem vínculos com os filmes anteriores (como Mera relembrando Artur sobre o Lobo das Estepes), mas ele é feito inteiramente para funcionar sozinho. De fato, Aquaman rejeita parte de sua aparição em Liga da Justiça e corre para uma apresentação mais individual. "Shazam", próximo filme da DC a sair no cinemas já é considerado fora do Universo Compartilhado. Então, como uma experiência, pode-se dizer que o filme funciona.
 
Em Atlântida, é sempre Natal.
  Visualmente temos uma película mais colorida e aberta, carregada de humor. O humor não me incomodou: de fato, achei bem dosado. Mas o visual dos atlantes e seu reino submerso são um tanto... carnavalescos.
  Tudo é multicolorido e berrante, palhetas absurdas até mesmo para criaturas com bioluminiscencia. Nada contra o fucsia ou o verde neón, mas elas poderiam serem apresentadas de forma mais suave e menos luminosa. Os efeitos fazem o filme ser uma mistura de "Tron" com "Max Steel", com uma computação forçada e muito visível às vezes. Os efeitos de flutuação, por exemplo, funcionam muito bem em planos fechados (palmas para os cabelos que flutuam na água), mas em planos abertos, ele fica evidente e inverossímil.

A Tribo dos Pescadores ou um Cavaleiro do Zodíaco?
  O filme retrata muito bem o fundo do mar, que é repleto de vida e formas. Cardumes de pequenos peixes estão sempre a se movimentar entre as pessoas, assim como animais marinhos maiores a flutuar no plano de fundo. A areia e os corais respondem a presença dos atores muito bem, assim como os reflexos da luz na água. Pena que o mesmo não acompanha a grande cidade real de Atlântida, que é limpa e simplista demais em sua concepção, lembrando qualquer série de ficção científica de médio orçamento que você possa ter assistido. Não agrega nenhuma novidade como fez Wakanda retro-tecnológica ou ainda a beleza e a imponência do paraíso de Themyscira. Parece que o design foi para o fundo do mar mesmo. 
  E por falar em desandar, que raios de trilha sonora é essa? Uma tentativa de produzir um fundo eletrônico, distorcido é nada mais que um arranhar sem sentido, feito por Rupert Gregson-Williams. Parece que ele colocou a música pra tocar embaixo d'água e seja lá o que saiu, foi o que acabou tocando no filme. Impossível desenvolver qualquer emoção por este trabalho, que muda de uma hora pra outra e sem sincronismo algum com a cena. Não consigo acreditar que este é o mesmo compositor do filme Mulher-Maravilha
    Jason Momoa nos entrega um Aquaman com um pé em "Novos 52", um rebelde inconsequente cheio de carisma, cujo direito ao trono é claro desde o início, mas nunca desejado por aquele que se sente rejeitado pelo seu próprio mundo. De fato, Momoa surpreende com um protagonista cheio de empatia e força. Amber Heard é uma Mera independente, que não precisaria ser o par romântico do herói, mas o filme trata de fazê-lo rapidamente (como se o mesmo precisasse de uma donzela em perigo, mesmo que Mera prove várias vezes que ela não precisa ser salva).
  Por último, deixo dois tópicos que, na minha opinião, são o coração de um filme: roteiro e direção.O primeiro é fraco, cheio de buracos e consegue se manter graças o empenho dos atores para com seus personagens.
  Adiciona-se uma "caça ao tesouro" desnecessária, que tenta trazer o passado de Atlântida à tona, mas naufraga. O Arraia Negra, interpretado por Yahya Abdul-Mateen II é absurdamente mal construído. Sua existência para a história é quase nula e deveria ter ficado restrito à cena pós-credito. Já o vilão principal da trama, rei Orm (o Mestre dos Oceanos e meio-irmão de Aquaman, interpretado por Patrick Wilson) é insonso e não representa nenhuma adversidade ao herói. Peso negativo que eu dou ao roteiro, uma vez que Patrick foi capaz de papéis excelentes em A Invocação do Mal e Sobrenatural, ambos sob a direção de Wan.
  O segundo ponto, a direção, não chega a ser de todo ruim, mas poderia ser bem melhor. James Wan é um diretor muito competente, mas em Aquaman ele se mostra como um marinheiro tentando controlar o timão de um barco preso em uma tempestade: o esforço é grande, mas o resultado é pequeno. A fotografia ajuda bastante, e a forma da narrativa parece acertada, mas o filme perde um pouco de liga na segunda metade, fazendo o restante ser um pouco indigesto. A duração do filme é excessiva e não ajuda. 

  Mesmo assim, James Wan já ganha pontos por não ter feito um filme sombrio como os que a DC tem por hábito de produzir. E a dosagem de humor é feita de forma correta, não sendo apelativo. A direção cria uma atmosfera de herói não convencional que não é esperada, mas é bem vinda.
  Aquaman não causa o impacto que gostariam, mas é um filme mais livre das amarras dos padrões DC que estamos acostumados. Para um herói sempre ridicularizado por falar com os peixes (poder muito bem empregado no filme, diga-se de passagem), ele apresenta bem mais que isso. Infelizmente não basta, por que apesar de algumas braçadas para se manter na superfície, falta fôlego e afunda. Não sei se vale o ingresso do cinema, talvez valha a pena vê-lo em outra ocasião. Em tempo: o rei do Povo da Salmoura é dublado por John Rhys-Davies, o Gimli de Senhor dos Anéis. E o monstro Karathen tem sua voz feita por ninguém menos que Julie Andrews!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe seu comentário após o sinal!